Rumo ao Monte Roraima não é apenas o nome de uma expedição — é um verdadeiro chamado à aventura, uma jornada que ecoa nas profundezas do espírito de quem anseia por conexão com a natureza em seu estado mais bruto e fantástico. Partir em direção a esse colosso de pedra é como atravessar um portal para outra realidade, onde cada passo revela um cenário mais extraordinário que o anterior.
Ao longo do caminho, o viajante se depara com savanas douradas que se estendem até onde a vista alcança, rios cristalinos que serpenteiam por entre pedras e florestas, e formações rochosas tão surreais que parecem ter saído de um planeta distante. Tudo isso compõe o espetáculo natural que envolve o Monte Roraima, um dos lugares mais antigos e misteriosos da Terra.
Para os povos indígenas, como os Pemon e os Taurepang, o monte é sagrado — o “berço dos deuses” e morada de Makunaima, o espírito ancestral. Essa aura mística transforma a jornada em algo maior do que uma simples trilha: é uma experiência de transcendência, de redescoberta e reverência.
Onde Fica o Monte Roraima e Por Que é Tão Fascinante
Localizado no coração da tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, o Monte Roraima se ergue como uma fortaleza de pedra que desafia o tempo e a lógica. Com cerca de 2.800 metros de altitude, ele marca o ponto mais alto do estado de Roraima e se destaca na paisagem como uma gigantesca mesa de pedra, cercada por penhascos quase verticais com mais de 400 metros de altura.
Mas o que realmente torna o Monte Roraima tão fascinante é que ele é um dos tepuis mais icônicos do Planalto das Guianas. Tepuis são formações geológicas únicas — montanhas de topo plano formadas há mais de 2 bilhões de anos, no período Pré-Cambriano. Essas estruturas milenares são consideradas ilhas isoladas no céu, com ecossistemas próprios e espécies que não existem em nenhum outro lugar do mundo.
A ciência se encanta com sua importância geológica, mas o Monte Roraima também é envolto em misticismo e lendas ancestrais. Para os povos indígenas locais, ele é sagrado: um local onde habitam deuses, espíritos e forças da natureza. Uma das lendas mais conhecidas conta que o monte é o corpo da deusa Makunaima, petrificada após uma grande batalha celestial — e que suas lágrimas formam as cachoeiras que escorrem pelas bordas da montanha.
A Travessia pelas Savanas
A jornada rumo ao Monte Roraima começa nas vastas savanas do Parque Nacional Canaima, na Venezuela — uma paisagem que, à primeira vista, parece infinita. A vegetação é predominantemente aberta, composta por gramíneas douradas que ondulam suavemente ao sabor do vento. Pequenos arbustos, bromélias resistentes e árvores solitárias pontuam o cenário, como se tivessem sido plantadas ali apenas para quebrar a monotonia e servir de abrigo à fauna local.
O clima é tropical, com dias quentes e ensolarados contrastando com noites frias e estreladas. A luz do sol parece mais intensa nesse terreno plano e vasto, criando sombras alongadas e realçando o relevo ondulado da região. É preciso respeitar o ritmo do corpo e o tempo da natureza — a travessia pelas savanas exige resistência, mas recompensa com uma beleza que vai se revelando aos poucos.
Enquanto os pés seguem firmes pela trilha, os ouvidos começam a captar a sinfonia da vida selvagem: o canto das aves que sobrevoam o céu limpo, o zumbido constante dos insetos, o grasnar dos sapos escondidos próximos aos cursos d’água. Em alguns momentos, o silêncio é tão profundo que se torna quase sagrado — interrompido apenas pelo som dos passos na terra seca e pelas batidas do coração.
A sensação de isolamento é intensa, mas nunca solitária. Estar ali, cercado apenas pela imensidão natural, provoca uma reconexão profunda com a terra. Não há distrações tecnológicas, nem pressa urbana. Existe apenas o presente — o vento, o sol, o horizonte. E, nesse presente, uma sensação rara: a de estar exatamente onde se deveria estar.
Atravessando Rios e Canais Naturais
Depois de cruzar a vastidão dourada das savanas, a expedição segue em direção a um dos trechos mais marcantes do caminho rumo ao Monte Roraima: a travessia dos rios. É nesse ponto que a paisagem começa a mudar sutilmente, ganhando contornos mais úmidos, verdes e sonoros — cortados pelo murmúrio constante das águas que descem da montanha.
Dois nomes marcam essa etapa: Rio Tek e Rio Kukenán. O primeiro é mais calmo, com águas translúcidas e rasas, o que permite uma travessia tranquila, embora escorregadia. Já o Kukenán, mais volumoso e imprevisível, exige atenção redobrada. Dependendo da época do ano e do nível da água, atravessá-lo pode significar se equilibrar sobre pedras lisas ou, em casos mais desafiadores, enfrentar a correnteza com o auxílio de cordas e guias experientes.
Esses momentos de travessia testam não apenas o físico, mas também a mente. A lama que se acumula nas margens, as pedras soltas no fundo e o frio cortante da água criam obstáculos que exigem calma, foco e um passo de cada vez. Mas é justamente nessa entrega que se revela um dos grandes encantos da jornada: o contato direto com a natureza em seu estado mais puro e selvagem.
A Chegada às Formações Rochosas de Outro Planeta
Após dias de caminhada, superando savanas escaldantes, rios gelados e terrenos acidentados, chega o momento mais esperado da jornada: a subida final do Monte Roraima. A inclinação é íngreme, a vegetação se torna mais densa e a trilha se fecha em um corredor natural de pedras e névoa. A sensação é de estar entrando em um portal — e, de certa forma, é exatamente isso.
Quando se alcança o topo, é como se a realidade fosse substituída por outra. O Monte Roraima revela paisagens que parecem ter sido tiradas de um mundo alienígena: um imenso platô envolto em nuvens, onde o tempo parece não existir. O solo é escuro e úmido, coberto por formações rochosas esculpidas pelo vento, pela chuva e por bilhões de anos de história geológica.
Algumas pedras lembram criaturas petrificadas, torres tortuosas, cogumelos gigantes ou figuras humanas. Outras formam labirintos naturais que se perdem no horizonte, alternando com jardins de cristais delicados e brilhantes, escondidos em fendas silenciosas. E por todos os lados, há abismos profundos, de onde a neblina sobe como um véu, ocultando o chão e intensificando a sensação de estar flutuando entre dois mundos.
A flora é única e fascinante. Pequenas plantas carnívoras, orquídeas minúsculas e musgos coloridos brotam em meio às rochas, adaptadas a um ambiente inóspito e mágico. São espécies que só existem ali, sobreviventes de um tempo remoto, intocadas pela presença humana.
Estar no topo do Monte Roraima é como caminhar sobre o esqueleto de um planeta antigo, onde tudo é silêncio, mistério e beleza bruta. Não há palavras suficientes para traduzir a energia do lugar, mas quem já esteve lá entende: não se volta o mesmo. O monte transforma.
Dicas para Quem Sonha em Ir Rumo ao Monte Roraima
Se, ao longo deste artigo, algo dentro de você despertou e começou a sussurrar “eu preciso viver isso”, então aqui vão algumas dicas essenciais para transformar esse desejo em realidade. Ir rumo ao Monte Roraima exige preparação, responsabilidade e respeito — com a natureza, com as culturas locais e com você mesmo.
Melhor Época para Visitar
A melhor época para realizar a expedição é entre setembro e março, quando as chuvas são menos frequentes e o acesso às trilhas está mais seco e seguro. No entanto, mesmo na estação “seca”, chuvas rápidas são comuns, especialmente no topo, onde o clima é instável e muda de uma hora para outra. A temporada chuvosa vai de abril a agosto, tornando a caminhada mais desafiadora — mas também mais verde e exuberante para os mais experientes.
Equipamentos Essenciais
Para garantir uma experiência segura e confortável, alguns itens são indispensáveis:
Mochila cargueira (com capa de chuva)
Bota impermeável e já amaciada
Roupas leves de secagem rápida + agasalho para noites frias
Capa de chuva e anorak
Lanterna de cabeça
Bastão de caminhada
Protetor solar, repelente e filtro solar labial
Kit de higiene e primeiros socorros
Cantil ou garrafa reutilizável (a água dos rios é potável!)
Saco de dormir adequado para frio e isolante térmico
Se contratar uma expedição organizada, barracas e refeições geralmente já estão incluídas.
Como Contratar uma Expedição Segura e Responsável
A entrada ao Monte Roraima costuma ser feita por Santa Elena de Uairén, na Venezuela, com acesso pelo município de Pacaraima (RR), no Brasil. A partir dali, é essencial contratar uma expedição autorizada, com guias experientes e equipe de apoio. Procure agências com boas avaliações, que trabalhem com guias indígenas locais e priorizem práticas sustentáveis.
Evite fazer o percurso por conta própria. Além dos riscos naturais, há exigências logísticas e ambientais que precisam ser respeitadas.
Cuidados com o Meio Ambiente
O Monte Roraima é um ecossistema frágil, com flora endêmica e áreas que ainda permanecem intocadas. Para preservá-lo:
Leve todo o seu lixo de volta (inclusive papel higiênico)
Use sabão biodegradável (ou evite usar sabão nos rios)
Caminhe somente pelas trilhas autorizadas
Respeite as orientações dos guias
Não retire pedras, plantas ou cristais como “lembrança”
Lembre-se: o maior presente que você pode levar é a memória da experiência vivida, e o maior respeito que pode demonstrar é deixar tudo como encontrou.
Conclusão
Ir rumo ao Monte Roraima é muito mais do que uma viagem: é uma travessia interior, uma experiência rara que combina natureza bruta, misticismo ancestral e superação pessoal. Cada passo nessa jornada nos leva para mais perto da essência do que significa aventurar-se verdadeiramente — longe do conforto, perto da alma.
Poucos lugares no mundo oferecem um cenário tão impressionante e, ao mesmo tempo, tão silenciosamente transformador. As savanas douradas, os rios gelados, as rochas esculpidas por milênios e o topo coberto por nuvens e silêncio… tudo ali parece nos lembrar que somos passageiros em uma Terra viva e antiga, e que há muito mais a ser sentido do que explicado.
E então, fica a pergunta:
O que você procura quando parte em direção ao desconhecido?
Talvez você busque respostas, ou talvez precise de silêncio. Talvez queira se testar, ou apenas respirar fundo e lembrar quem você é sem distrações. Seja qual for o motivo, essa jornada oferece o espaço e o tempo para você descobrir.